Patrícia Monteiro
A recoleção da madeira e a sua utilização como combustível terão sido atividades importantes para as comunidades do III milénio AC e da Idade do Bronze Inicial que ocuparam o sítio dos Perdigões. Testemunho disso são os carvões de madeira recolhidos ao longo das campanhas nas várias estruturas identificadas. Um estudo antracológico realizado no âmbito de uma colaboração entre a ERA Arqueologia, a Universidade de Kiel e o Laboratório de Arqueociências da Direção-Geral do Património Cultural, permitiu a identificação das espécies que estariam a ser exploradas durante este período.
Carvões foram recolhidos manualmente e através da flutuação de sedimentos provenientes de vários contextos da ocupação do sítio: fossas, buracos de poste, valas, perfil. Um total de 610 fragmentos foram analisados ao microscópio de luz refletida (x100/x200) para identificação taxonómica (Schweingruber, 1990).
Durante a 1ª metade do III milénio AC, nas estruturas associadas ao “Timber Circle”, foi identificada a presença de madeira arbórea, nomeadamente pinheiro (Pinus pinea/pinaster e Pinus sp.) e provavelmente azinheira (Quercus (perenifólio)). Segundo os dados obtidos neste estudo, a utilização de espécies arbustivas terá ocorrido numa fase posterior, entre a 1ª metade e a metade do III milénio A. C., onde se identificou a presença de zambujeiro (Olea europaea) e medronheiro (Arbutus unedo). Uma maior frequência de madeira arbustiva, medronheiro (Arbutus unedo), urzes (Ericaceae) e aroeira (Pistacia lentiscus) juntamente com uma dominância de azinheira (Quercus (perenifólio)) e o desaparecimento do pinheiro nos conjuntos, marcam, a partir da fase Campaniforme até à Idade do Bronze Inicial, uma alteração nas modalidades de aquisição da madeira para combustível nestes períodos. Os resultados antracológicos, na generalidade, corroboram com a paisagem expectável na região (Capelo e Vila-Viçosa, 2021) e com o registo polínico (Danielsen e Mendes, 2015).
Embora os carvões recolhidos se encontrassem depositados em estruturas antrópicas não é possível, para já, precisar uma associação direta dos mesmos à funcionalidade dos contextos arqueológicos em questão devido à sua provável deposição secundária (Chabal, 1992). No entanto, os resultados podem caracterizar as modalidades de aquisição da madeira destas comunidades durante as diversas ocupações do sítio, sendo que as mesmas estarão, muito provavelmente, alinhadas com a funcionalidade e atividades da ocupação.
Os dados apresentados serão publicados num artigo que se encontra em preparação e integrarão um estudo mais alargado e em curso no âmbito do projeto dos Perdigões.
Imagem – Secção transversal de um fragmento de carvão de Pinus pinea/pinaster, proveniente do depósito [676], “Timber Circle” (1ª metade do III milénio).
Referências:
Capelo, J., Vila-Viçosa, C. (2021) Vegetação do Alentejo. In: Capelo, J., Aguiar, C. (coord.) A Vegetação de Portugal. Edições Lisboa Capital Verde Europeia 2020. Imprensa Nacional.
Chabal, L. (1992). La représentativité paléo-écologique des charbons de bois archéologiques issus du bois de feu. Bulletin de la société botanique de France. Actualités Botaniques, 139(2-4), 213-236.
Danielsen, R., Mendes, P. (2015). Os Perdigões (Campanha 2013) Relatório de Palinologia. Trabalhos do LARC 6. Lisboa
Schweingruber, F.H., (1990). Anatomy o f European woods. Haupt, Bern, Sttutgart.